Aikido: a arte da paz
- Aline Negromonte
- 8 de nov. de 2017
- 5 min de leitura
Suas origens e a opinião de praticantes do primeiro dojo de Juiz de Fora

À esquerda: os kanjis (ideogramas japoneses) para "aikido". À direita: técnica de aikido chamada de Irimi Nag, que pode ser traduzida como 'projeção entrando' (fonte: CorreioWeb).
Uma arte marcial nascida no Japão, criada por Morihei Ueshiba (1883-1969) entre meados dos séculos 30 e 60, que busca a harmonia. O aikido (pronuncia-se aiquidô) é peculiar, é filosofia, defesa pessoal e espiritualidade, é um budo (budô - caminho de vida). Nesta arte marcial, o foco é usar a agressividade do adversário para criar uma nova resposta, não agressiva. Nas palavras de Ueshiba, também chamado de O-Sensei ("Grande Mestre"):
“O Aikido não é uma técnica para lutar contra um inimigo ou derrotá-lo. É uma maneira de conciliar as diferenças que existem no mundo e fazer dos seres humanos uma família. Isto quer dizer que o segredo do Aikido é a busca da harmonia com o universo, é tornar-nos unos com o universo. Seus praticantes devem buscar esse entendimento por meio do treinamento diário.”

Morihei Ueshiba (fonte: Pinterest).
Morihei Ueshiba também escreveu um livro chamado "A arte da paz", onde descreve parte de sua flosofia. Para ele, "ferir um oponente é ferir a si mesmo. A arte da paz é controlar a agressão sem produzir ferimentos. A verdadeira vitória é a autovitória." É por isto que o aikido também é conhecido por "arte da paz". Um reflexo desta mentalidade é que não existem competições de aikido, e sim encontros onde os praticantes repassam seus conhecimentos. A ideia é não estimular o ego, afinal, nesta arte, a superação se dá em si mesmo.
Mas você sabe o significado de aikido? Ele pode ser traduzido como "o caminho da unificação com a energia da vida". O sensei ("mestre") pioneiro em Juiz de Fora, Luís Ricardo Silva, tem a resposta mais detalhada.
História e significados
Luís Ricardo pratica aikido há mais de 30 anos. O seu dojo ("lugar de treino"), Nokiochi Dojo , foi criado em 1991. "O aikido fala que a energia trabalha de uma forma sempre circular, em espiral. E todas as técnicas do aikido têm o mesmo princípio, de buscar esse movimento espiral. E como ele trabalha esta energia de forma natural, não existe essa ideia de ódio, de raiva, de rancor", afirma. Uma característica interessante de sua profissão, como ele mesmo aponta, é que "sensei" é muitas vezes traduzido literalmente como "professor", "mestre", mas representa algo muito maior na cultura japonesa.

Kanjis "Sen" e "Sei" = Sensei (fonte: TgfCoder).
"O que um sensei faz é muito mais além do que chegar na sala e apenas dar aula. "Sensei" é formado por dois kanji: o sen, de 'conhecimento', e o sei, de 'nascer primeiro', 'ser mais antigo'. O sensei é aquele cara que nasceu antes de você, e tem mais conhecimento que você, em tudo. A ideia de sensei é muito mais forte do que pensamos."
E sobre a história de Morihei Ueshiba, o sensei Ricardo conta que ele sempre praticou diferentes tipos de luta, além de pesquisar muito e viajar. Seu caminho se cruzou com um mercenário brutal, um homem que matava sem piedade e por um preço predeterminado, do qual foi aluno por um período. Apenas anos mais tarde, criou seu próprio estilo de arte marcial. Parte deste conhecimento também foi espiritual, quando O-Sensei conheceu a religião Omoto-Kyo e se tornou seguidor e protetor do monge Onisaburo-Deguchi.
Práticas da arte marcial
Como já comentado, o aikido é um budo, e combina aspectos técnicos, filosóficos e espirituais. Mas como é a parte prática? No total, a arte comporta mais de 100 técnicas, todas ensinadas com seu nome original em japonês. Mas não se preocupe: elas são explicadas do zero para iniciantes.
O advogado Rodrigo de Assis Lazzarini pratica aikido há dezenove anos: "exatamente no dia 21 de setembro de 1999, às 17:32", ri. "É bem marcante para mim o começo desta arte marcial. O aikido passou por todas as fases da minha vida, ele me transformou, efetivamente. A grande palavra do aikido é o equilíbrio. Eu sou advogado, é uma profissão extremamente estressante, não tem horário para nada. O aikido me ajuda a contornar estes percalços da vida, é como a água: a gente vai contornando as rochas, este caminho. Ainda aprendo todos os dias, mesmo com estes dezenove longos anos."
Atualmente, Lazzarini é um Senpai (instrutor Sansuikai, uma das confederações brasileiras de aikido) e conta como conseguiu seu título, após adquirir a faixa preta. O Senpai também desvenda um ritual que sempre inicia a prática de aikido, a saudação ao O-Sensei, e explica algumas técnicas.
A palavra das aikidokas (praticantes de aikido)
A psicopedagoga Débora Müller é atualmente faixa amarela e está muito satisfeita com o aikido em sua vida. "Aqui no dojo eu descobri o autocontrole, a calma - que eu não tinha antes - o controle da minha ansiedade, paciência, disciplina... Todos os 'itens', digamos assim, que nós não temos hoje em dia. Ética, humanização... Tudo isso eu encontrei aqui", declara. Para ela, o aikido trabalha não só com a autodefesa, mas com a autoconstrução. Além disso, a ideia de doação é muito presente. "Um tem que aprender com o outro e tem que doar-se. Eu tenho que doar o meu corpo para o outro parceiro, para ele fazer a técnica, e o outro tem que doar para mim. É um momento de troca de energia, de movimento, de tanta interação... Você descobre o seu limite e o limite do outro".

Débora Müller no pós-treino. (acervo pessoal)
Ela iniciou a arte marcial em um momento muito difícil, quando sofreu assédio sexual de um estranho a caminho do trabalho e decidiu que a defesa pessoal iria lhe trazer empoderamento.
Hoje, casada com Thiago Müller, é uma feliz grávida de 3 meses e pretende continuar com o aikido, dentro do possível, se permitido por seu médico, claro. "Há períodos em que não vou poder lutar. Mas o sensei vai adaptar uma aula específica para mim, onde posso mover os braços, por exemplo." Para ela, o aikido também tem um valor espiritual, que pretende passar as boas energias para seu bebê, já que o centro de energia do corpo da mulher é o útero (no do homem, a próstata).
Já a administradora e comunicadora empresarial, Cátia Malhão, entrou para o aikido por curiosidade e interesse, há sete anos atrás. "O primeiro motivo que eu quis entrar foi para mostrar que uma pessoa, que para a sociedade aparenta ser frágil, seja homem ou mulher, pelo biotipo, aqui, não existe isso. O que precisa é técnica, é a disciplina. Então isso me chamou a atenção."
Hoje faixa marrom, ela completa que considera a técnica do aikido propícia para a mulher, trabalha com o corpo, mente e espírito. Como o aikido envolve a questão da disciplina, isto se mostra em outras áreas da vida, ele a ajuda a lidar com sentimentos e momentos de pressão e estresse. É possível focar e "achar o caminho reto das suas emoções. O aikido é uma arte marcial completa", afirma.
Para Cátia, o aikido também é uma forma de defesa pessoal calcada na realidade e nada fantasiosa, como o que se vê em alguns filmes, por exemplo. "Se alguém me atacar, eu consigo fazer todas as técnicas. Ele me traz segurança na hora de praticar", explicita.
Um vislumbre da prática do aikido
Uma filmagem rara, de 1934, do estúdio japonês Asashi, mostra o criador Ueshiba ensinando aikido a seus discípulos. Já é possível perceber alguns de seus intrincados movimentos circulares.
Por fim, trechos de uma aula no Nokiochi Dojo em Juiz de Fora, em 2017. Percebe-se a saudação ao O-Sensei, as práticas de rolamento no início, os movimentos circulares e a não-divisão por gênero que a luta possibilita, guardado o respeito pelos níveis de faixa de cada um (mulheres podem lutar com homens).
Curiosidade: subgêneros do Aikido
O aikido também possui subgêneros, que são válidos porque respeitam os preceitos básicos do aikido, como o foco na defesa e a não-violência, bem como a busca pela harmonia. São eles:
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